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25/03/2025 20h21

Uma Nova Perspectiva Sobre a Resposta Imunológica na Sepse

Neutrófilos CXCR4+ PD-L1+: Potenciais Alvos Terapêuticos em Sepse

Profa. Dra. Vanessa Carregaro Pereira

Pesquisadores do Centro de Pesquisas em Doenças Inflamatórias (CRID) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP-USP) identificaram uma população específica de neutrófilos que pode explicar por que alguns pacientes com sepse apresentam evolução desfavorável. O estudo, CXCR4+ PD-L1+ neutrophils are increased in non-survived septic mice, aceito para publicação na revista científica interdisciplinar iScience (Cell Press), revela que camundongos que não sobreviveram à sepse apresentaram maior frequência de neutrófilos expressando simultaneamente CXCR4 e PD-L11, proporcionando insights potencialmente promissores para o tratamento personalizado desta condição .

Por que este estudo é importante?

A sepse é uma condição grave em que o organismo responde de forma exagerada a uma infecção, desencadeando uma inflamação sistêmica que pode levar à falência de múltiplos órgãos e morte. Apesar dos avanços no tratamento, permanece um desafio global de saúde pública, com alta mortalidade em unidades de terapia intensiva. O que intrigava os pesquisadores era a heterogeneidade nas respostas - mesmo em indivíduos com características genéticas idênticas, alguns sobrevivem enquanto outros sucumbem.

O Dr. Guilherme Cesar Martelossi Cebinelli, pesquisador do CRID, juntamente com a equipe do Prof. Fernando Queiroz Cunha, identificaram que essa heterogeneidade pode estar ligada a uma população específica de neutrófilos que expressam os marcadores CXCR4 e PD-L1, sendo mais abundantes em camundongos que não sobreviveram à sepse. Esta descoberta é fruto do trabalho de doutorado do Dr. Cebinelli no programa de Imunologia Básica e Aplicada da FMRP-USP.

Principais descobertas

  1. Inflamação Neutrofílica: Os camundongos que não sobreviveram apresentaram maior frequência de neutrófilos imaturos expressando CXCR4 e PD-L1 na circulação sanguínea.

  2. Acúmulo de neutrófilos pulmonar: Estes neutrófilos se acumularam preferencialmente nos pulmões dos animais não sobreviventes, contribuindo potencialmente para lesões teciduais e disfunção de órgãos.

  3. Papel do IFN-gamma2: O Interferon-gamma (IFN-γ) mostrou-se essencial para a expressão de PD-L1 em neutrófilos, promovendo sua sobrevida prolongada e aumentando sua capacidade de causar lesões teciduais.

  4. Validação funcional: Camundongos deficientes em IFN-γ apresentaram redução de 50% na susceptibilidade à sepse, com diminuição na frequência de neutrófilos CXCR4+ PD-L1+, confirmando a relevância desta via.

  5. Abordagem inovadora: Utilizando sequenciamento de RNA de célula única (scRNA-seq)3, os pesquisadores mapearam com precisão sem precedentes as diferenças nos perfis de ativação imunológica entre animais sobreviventes e não sobreviventes, revelando assinaturas moleculares específicas associadas ao prognóstico.

Implicações clínicas

A pesquisa revela mecanismos moleculares associados ao agravamento do fenótipo hiperinflamatório da sepse. Os neutrófilos CXCR4+ PD-L1+ representam potenciais alvos para a modulação terapêutica na sepse, especialmente no fenótipo hiperinflamatório.

O estudo aponta neutrófilos neutrófilos CXCR4+PD-L1+ como biomarcador para identificar pacientes com maior risco de evolução desfavorável, permitindo intervenções terapêuticas precoces e personalizadas. Terapias focadas em bloquear a expressão de PD-L1 ou inibir a sinalização por IFN-γ ser estratégias eficazes para reduzir a mortalidade em pacientes com o fenótipo hiperinflamatório da sepse.

"Este trabalho representa um importante avanço na compreensão dos mecanismos da sepse. No CRID, temos dedicado mais de duas décadas à investigação desta síndrome complexa, e a identificação desta subpopulação específica de neutrófilos é mais um passo para entender por que pacientes geneticamente semelhantes apresentam desfechos tão distintos. Esta descoberta abre caminho para o desenvolvimento de terapias personalizadas baseadas no perfil imunológico individual." - Prof. Dr. Fernando Queiroz Cunha, coordenador do Centro de Pesquisas em Doenças Inflamatórias (CRID) da FMRP-USP.

Perspectivas futuras

Os pesquisadores agora buscam validar esses achados em amostras de pacientes com sepse, para determinar se os mesmos mecanismos observados em camundongos estão presentes em humanos. Se confirmados, esses resultados poderiam levar ao desenvolvimento de novos testes diagnósticos e terapias direcionadas.

A compreensão dos mecanismos subjacentes à heterogeneidade nas respostas à sepse representa um passo importante para o desenvolvimento de tratamentos personalizados para esta condição que ainda apresenta alta mortalidade mundial.
 


Referência: Cebinelli, G.C.M., de Oliveira Leandro, M., Rocha Oliveira, A.E., et al. (2025). CXCR4+ PD-L1+ neutrophils are increased in non-survived septic mice. iScience, 112083. https://doi.org/10.1016/j.isci.2025.112083

Sobre a revista: iScience é uma revista científica revisada por pares da Cell Press que fornece uma plataforma para pesquisas originais nas ciências da vida, físicas, da terra, sociais e da saúde. Com fator de impacto de 4.6, a revista promove o pensamento interdisciplinar e considera pesquisas com contribuição significativa para um campo relevante, priorizando resultados robustos e metodologia sólida.

Sobre o autor: Guilherme Cesar Martelossi Cebinelli é Biomédico formado pela Universidade Estadual de Londrina, mestre e doutor em Ciências pelo programa de Imunologia Básica e Aplicada da FMRP-USP. Desenvolveu seu doutorado no Laboratório de Inflamação e Dor investigando mecanismos celulares associados ao desfecho da sepse com tecnologia de sequenciamento de RNA de célula única. Atualmente, é especialista em pesquisa experimental no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein.

Financiamento: Este trabalho foi apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), sob os números de concessão 2019/15070-0 e 2013/08216-2.

GLOSSÁRIO

1. Neutrófilos CXCR4+ PD-L1+: Subpopulação de glóbulos brancos que expressam o receptor de quimiocina CXCR4 (associado à imaturidade e migração) e a proteína PD-L1 (que modula respostas imunes).

2. Interferon-gama (IFN-γ): Citocina produzida principalmente por células T e NK que desempenha papel importante na ativação de células imunes e na resposta contra infecções. No contexto da sepse, pode promover inflamação excessiva e dano tecidual.

3. scRNA-seq: Sequenciamento de RNA de célula única, técnica que permite analisar o perfil de expressão gênica de milhares de células individuais simultaneamente.

 

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