10/06/2025
Brain drain: o êxodo científico norte-americano e seus reflexos globais
A comunidade científica internacional acompanha com preocupação o êxodo crescente, e até agora silencioso, de pesquisadores dos Estados Unidos, fenômeno que se intensificou após o retorno de Donald Trump à presidência em janeiro de 2025. As primeiras medidas orçamentárias de seu novo governo incluíram cortes profundos em agências estratégicas como o NIH (Instituto Nacional de Saúde), o NSF (Fundação Nacional de Ciência), o CDC e a NASA, afetando diretamente projetos em andamento e gerando insegurança entre cientistas (Mervis, 2024).
Pesquisadores de áreas como Saúde, Clima, Inteligência Artificial e Ciências Espaciais relatam paralisações de bolsas, demissões em centros de pesquisa e o cancelamento de programas de cooperação internacional. Uma pesquisa recente da revista Science aponta que mais de 70% dos cientistas norte-americanos consideram buscar oportunidades no exterior. Países como Alemanha, Canadá, Austrália e Coreia do Sul têm se tornado destinos preferenciais, oferecendo financiamento estável, liberdade acadêmica e apoio institucional (Mervis, 2024).
Mas o impacto do brain drain americano vai além do orçamento. Instituições acadêmicas dos EUA têm registrado queda significativa na presença de cientistas estrangeiros em conferências e colaborações. O motivo? A intensificação dos controles migratórios. Pesquisadores relataram revistas em dispositivos eletrônicos, interrogatórios arbitrários e procedimentos rigorosos nas fronteiras, inclusive com orientações de Universidades americanas para que convidados internacionais adotem medidas como o uso de “burner phones”, limitando o acesso a dados pessoais por parte das autoridades alfandegárias(Kupferschmidt, Science, 2024).
A política migratória restritiva, aliada à retórica de desconfiança contra estrangeiros, transforma o país, que por décadas foi símbolo da ciência aberta e colaborativa, em um ambiente hostil (The Guardian, 2025). Conferências internacionais estão sendo reformuladas em formatos híbridos ou transferidas para países mais acolhedores. A Ciência, que depende da livre circulação de ideias e pessoas, começa a sentir os efeitos da fragmentação. Segundo o Financial Times, as novas diretrizes de controle de fronteiras já estão impactando não apenas na Ciência, mas também no setor empresarial, forçando Universidades e empresas a reverem seus protocolos de viagens (FT, 2025).
O Brasil, que mantinha colaborações importantes com o NIH e o CDC, já sente os efeitos dessa retração. Projetos em Imunologia, Doenças Infecciosas e Saúde Pública enfrentam suspensão de recursos, inviabilização de testes em rede e aumento dos custos com insumos importados. Há, ainda, uma perda simbólica: a erosão de uma cultura de intercâmbio científico baseada em confiança, liberdade e diálogo multilateral.
Ao contrário do que se poderia esperar, essa crise não gera redistribuição automática de recursos ou fortalecimento espontâneo de outros Centros de Ciência. O que se observa é um reordenamento do mapa da Ciência Global sob o signo da instabilidade, onde a fuga de cérebros não é redirecionada, mas dispersa.
Um ambiente onde as fronteiras se fecham para as ideias, o conhecimento deixa de circular.
Referências:
- Kupferschmidt, K. International scientists rethink U.S. conference attendance. Science, 29 mar. 2024. Disponível em: https://www.science.org/content/article/international-scientists-rethink-us-conference-attendance.
- Mervis, J. Scientists consider leaving the U.S. as research climate worsens. Science, 29 mar. 2024. Disponível em: https://www.science.org/content/article/scientists-consider-leaving-us-research-climate-worsens.
- The Guardian. Australian academics refuse to attend US conferences for fear of being detained. 14 abr. 2025. Disponível em: https://www.theguardian.com/australia-news/2025/apr/14/australian-academics-refuse-to-attend-us-conferences-for-fear-of-being-detained.
- Financial Times. Stricter US border controls prompt business travel rethink. 22 abr. 2025. Disponível em: https://www.ft.com/content/41e1e8db-bf4d-435f-ae63-085f8cd28797.
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