13/02/2025
Estudo do ICB-USP e Instituto Butantan revela mecanismos de resistência da leptospirose
O planeta enfrenta um aumento significativo na frequência e intensidade de desastres climáticos, impulsionado pelas mudanças no clima global. Eventos extremos, como furacões, secas prolongadas e ondas de calor, estão cada vez mais comuns, e entre eles, as enchentes e alagamentos se destacam pelo impacto devastador que causam nas populações atingidas. O número de pessoas afetadas por inundações cresceu exponencialmente nas últimas décadas, agravando crises humanitárias, deslocamentos forçados e emergências de saúde pública.
Além da destruição de infraestrutura e da perda de vidas, esses desastres têm consequências severas para a saúde. O contato com águas contaminadas aumenta o risco de surtos de doenças infecciosas, como leptospirose, hepatites e infecções gastrointestinais. O colapso dos sistemas de saneamento, a precariedade no acesso à água potável e o aumento da proliferação de vetores, como mosquitos transmissores da dengue, criam um cenário preocupante.
Tendo isso em vista, pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, em colaboração com o Laboratório de Bacteriologia do Instituto Butantan, revelaram mecanismos sofisticados utilizados pela bactéria Leptospira para escapar do sistema imunológico humano, abrindo novas perspectivas para o desenvolvimento de vacinas e terapias. Conhecida como “doença da urina do rato”, a leptospirose representa um grave problema de saúde pública, especialmente em países tropicais como o Brasil. Condições como enchentes recorrentes, saneamento básico deficiente e o clima quente e úmido favorecem a transmissão da bactéria.
Entre os achados mais relevantes do estudo, estão proteases (proteínas que atuam como enzimas, quebrando ligações presentes em reações químicas) secretadas por Leptospiras, como a termolisina e a leptolisina, que degradam componentes essenciais do sistema complemento – um conjunto de mais de 40 proteínas do sistema imune responsável por eliminar microrganismos. Essa ação enfraquece o controle da infecção, inclusive dificultando a fagocitose, processo crucial no qual células imunes englobam e destroem patógenos. Além disso, foi demonstrado que a Leptospira sequestra proteínas reguladoras do sistema complemento, como o Fator H, a C4BP (C4b binding protein) e a vitronectina, utilizando-as para dificultar a resposta imune.
Esses mecanismos foram detalhadamente caracterizados em modelos experimentais e clínicos e publicados em revistas científicas, entre eles o artigo que acaba de ser publicado pela Microbes and Infection. O grupo liderado pela pesquisadora Angela Silva Barbosa, do Instituto Butantan, foi responsável pela identificação e caracterização da leptolisina, uma das proteases investigadas. Na USP, o trabalho foi liderado pela professora Lourdes Isaac, do Departamento de Imunologia do ICB. A pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
O estudo abre portas para soluções terapêuticas como vacinas, que ainda não existem para humanos. A maioria dos casos de leptospirose apresenta sintomas leves, mas a doença pode evoluir para formas graves, como insuficiência renal, hepática e pulmonar, além de meningite. A precariedade de saneamento básico em muitas regiões agrava o cenário, favorecendo a proliferação de roedores e aumentando a exposição das populações mais vulneráveis. Além disso, a capacidade da Leptospira de sobreviver por meses em condições úmidas e quentes reforça a importância de medidas preventivas adequadas, especialmente durante enchentes e alagamentos.
Referências
https://jornal.usp.br/ciencias/cientistas-desvendam-como-bacteria-da-leptospirose-escapa-do-sistema-de-protecao-humano/
https://jornal.usp.br/radio-usp/realocacao-da-populacao-local-e-a-melhor-solucao-contra-as-cheias-do-jardim-pantanal/
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-com-ciencia/noticias/2024/julho/saiba-quais-sao-as-doencas-pos-enchentes-e-como-ocorre-o-tratamento
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