NOTÍCIAS

MENU NOTÍCIAS

25/02/2022

Neutrófilos e a regulação do metabolismo

Lentes do CRID de hoje convida a pesquisadora Juliana Escher Toller para apresentar sua pesquisa sobre o papel da PKM2 na regulação do metabolismo e das funções dos neutrófilos.

Os neutrófilos são os leucócitos mais abundantes no sangue humano, responsáveis pela primeira linha de defesa na destruição dos patógenos. Essas importantes células do sistema imune inato dependem principalmente do metabolismo glicolítico para exercerem suas funções microbicidas. O papel da Piruvato Quinase do tipo M2 (PKM2), uma enzima que converte fosfoenolpiruvato em piruvato nos passos finais da glicólise, já foi descrito em muitas células do sistema imune. Entretanto, seu papel nas funções dos neutrófilos não foram estabelecidos. O objetivo deste trabalho é identificar se a PKM2 é importante para regular as funções dos neutrófilos, especialmente a produção de espécies reativas de oxigênio (ROS) e as vias metabólicas envolvidas nessa regulação.

Flavio: Olá Juliana, tudo bem? Em primeiro lugar, gostaria de agradecer sua disponibilidade para participar do quadro. Queria começar sabendo um pouco sobre você, de onde veio, qual graduação você cursou, coisas do gênero. Pode nos contar um pouco?

Juliana: Nasci em Bebedouro, no interior do estado de São Paulo e desde pequena me interessei por ciências. Me formei em Ciências Biológicas pela UNIFAFIBE e, durante a graduação, tive a oportunidade de realizar uma Iniciação Científica na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP-USP) sob orientação da Profa. Fernanda de Freitas Anibal. Eu aprendi a escrever um projeto, desenvolver uma hipótese e realizar experimentos, o que me fez perceber que queria ser pesquisadora. Fiz meu mestrado e doutorado pelo programa de Imunologia Básica e Aplicada da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP-USP) sob orientação da Profa. Cleni Mara Marzocchi Machado. Atualmente desenvolvo meu pós-doutorado com o Prof. José Carlos Farias Alves Filho pelo programa de Farmacologia da FMRP-USP.

Flavio: Há quanto tempo está conosco no CRID e como chegou até aqui?

Juliana: Estou há 5 anos no CRID. Conheci o Prof. José Carlos Farias Alves Filho durante uma banca na FMRP-USP, onde conversamos sobre a importância do metabolismo para as funções dos neutrófilos e de como as informações disponíveis na literatura eram antigas e genéricas. Escrevemos e enviamos um projeto para a FAPESP e fui contemplada com a bolsa de pós-doutorado em 2017. 

Flavio: Já faz um tempinho então!! Sempre digo que é muito interessante observar a trajetória de cada um até aqui. Mas e agora, quais seus planos futuros como pesquisadora?

Juliana: Meu objetivo no momento é desenvolver um segundo pós-doutorado no exterior e, daqui alguns anos, ser professora em uma universidade pública no Brasil.

Flavio: Está certa, temos que nos manter sempre correndo atrás dos nossos objetivos. Acredito que todo esse trajeto não foi fácil. Teve algum momento que pensou em desistir, começar do zero em outro lugar? E o que te manteve firme no seu propósito de pesquisadora?

Juliana: Sim, houveram momentos difíceis em que pensei em desistir. Isso foi muito ligado ao fato dos experimentos não darem certo, da autocobrança e do investimento cada vez menor em pesquisa no Brasil. Além disso, a pesquisa é uma área competitiva, o que pode ser exaustivo mentalmente. Não desisti porque acreditava nos meus projetos de pesquisa e gostava muito do ambiente acadêmico. Aprendi a lidar com a autocobrança e entendi que cada pesquisador tem seu próprio ritmo e maneira de pensar, o que torna cada pesquisa única. 

Flavio: Fico feliz que tudo tenha dado certo, no final das contas. Falando um pouco agora da sua linha de pesquisa, queria ter uma noção geral do que é e para que serve um neutrófilo. Consegue explicar para a gente?

Juliana: O neutrófilo é uma célula do sistema imune inato, a primeira linha de defesa do organismo contra patógenos. Ele possui um potente arsenal que tem como função destruir microrganismos. Para se ter uma ideia da importância dessa célula, pessoas com defeitos nas funções dos neutrófilos têm uma maior incidência de infecções.

Flavio: Me parece um componente muito importante do nosso sistema imunológico mesmo. Pode ainda nos falar simplificadamente como ele consegue atuar na defesa do organismo contra os patógenos?

Juliana: O neutrófilo é a primeira célula a reconhecer um patógeno quando ele invade o organismo. Esse reconhecimento ocorre por receptores específicos na membrana celular, o que desencadeia as respostas funcionais dos neutrófilos. Entre elas estão a fagocitose, a degranulação, produção de ROS e formação de NETs (neutrophil extracellular traps, ou armadilhas extracelulares). Todas essas respostas têm o mesmo objetivo: conter e matar os patógenos.

Flavio: E onde se encaixa a PKM2 nesse processo?

Juliana: A PKM2 é uma enzima da via glicolítica, que regula os passos finais da glicólise. Já se sabe que a PKM2 é um importante regulador da resposta inflamatória de outras células imunes, como macrófagos e linfócitos, mas seu papel em neutrófilos não é bem estabelecido. Nossos resultados demonstram que a PKM2 é capaz de modular a produção de ROS e consequentemente a capacidade dos neutrófilos matarem bactérias e, no momento, estamos investigando como esse processo ocorre.

Flavio: Que interessante!! E como você pretende comprovar essa hipótese?

Juliana: Investigando quais vias metabólicas estão envolvidas na produção de ROS em neutrófilos ativados e qual (ou quais) delas é modulada pela PKM2. 

Flavio: Parece que terá muito trabalho daqui pela frente. Mas, no final das contas, o que a levou a investigar o papel dessa enzima nesses leucócitos? Sua linha de pesquisa já englobava essa questão?

Juliana: Faz 12 anos que trabalho com o neutrófilo. Durante o mestrado estudei como polimorfismos genéticos em receptores de membrana modulavam a produção de ROS em neutrófilos de indivíduos saudáveis e de pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES). No doutorado investiguei como a obesidade modulava a resposta de neutrófilos e como isso poderia influenciar no desenvolvimento do LES em um modelo experimental. Os resultados obtidos nesse trabalho me fizeram questionar o papel de vias metabólicas intracelulares para a resposta de neutrófilos. Dessa maneira, no pós-doutorado eu decidi estudar como a via glicolítica modula a resposta de neutrófilos, com foco no papel da PKM2, pois ela é uma importante enzima glicolítica que modula a resposta de outras células imunes.

Flavio: Falando um pouco sobre futuro, caso você consiga comprovar essa relação, qual o impacto disso na ciência e quais seus próximos passos?

Juliana: A PKM2 poderia ser um potencial alvo farmacológico em diversas doenças inflamatórias, provendo uma resposta imune mais eficaz durante infecções por patógenos. O projeto está sendo finalizado e o próximo passo é submeter o artigo para publicação em uma revista de alto impacto.

Flavio: Definitivamente estamos torcendo para que o projeto transcorra da melhor forma possível. Você consegue prever alguma dificuldade nesse caminho, ou já teve que enfrentar alguma até agora?

Juliana: No início foi difícil padronizar os experimentos para avaliar as vias metabólicas importantes para a produção de ROS nos neutrófilos pois era um campo novo de estudo para mim e essas células responderam de maneira diferente ao esperado. 

Flavio: Considerando agora sua posição como pesquisadora aqui do CRID, qual a relação existente entre sua linha de pesquisa e das Doenças Inflamatórias, foco do nosso centro de pesquisas?

Juliana: Respostas não controladas dos neutrófilos podem levar à inflamação e à lesão tecidual, além de prejudicar a eliminação de patógenos. Dessa maneira torna-se importante entender os mecanismos envolvidos na modulação da resposta dessas células e identificar potenciais alvos terapêuticos. 

Flavio: Um outro ponto Juliana, na sua percepção, qual a importância da difusão científica tanto para a comunidade científica quanto para a população geral?

Juliana: Na minha opinião a difusão científica é muito importante para a comunidade científica pois promove a discussão e troca de informações, que são muito importantes para a criatividade e o surgimento de novas ideias. Em relação à população em geral, a difusão permite que as pessoas tenham acesso à informação e entendam a importância da ciência no seu cotidiano. 

Flavio: Olha, Juliana, meus sinceros agradecimentos por nos permitir bater esse papo contigo. Espero que tenha sido tão proveitoso para você como foi para a gente. Quer acrescentar algum ponto que não foi abordado ao longo da discussão?

Juliana: eu que agradeço a oportunidade, foi ótimo! Não tenho mais nada a acrescentar, acredito que abordamos todos os pontos importantes.

Flavio: Então, por hoje é só! Pode nos indicar onde conseguimos saber mais sobre sua linha de pesquisa? 

Juliana: No link do meu currículo Lattes.

Flavio: Pois bem, parabéns e boa sorte em seus próximos passos!!

Juliana: Muito obrigada!



Entrevistada: Juliana Escher Toller-Kawahisa  I   Entrevista realizada por: Flavio Pinheiro Martins, CRID - Difusão e Ensino I  Revisão: Anna Flavia Lima- FMRP

Assine nossa newsletter